Trechos da BR-369 administrados pela Econorte têm uma das tarifas mais caras do País, mas estado geral da estrada é considerado regular por pesquisa da CNT
A suspeita de superfaturamento no valor de obras realizadas e de contratos fictícios para pagamento de propina a agentes públicos, alvo da Operação Integração, 48ª fase da Lava Jato, trouxe de volta a discussão da necessidade de revisão dos contratos das concessões do Anel de Integração e a disparidade entre os valores das tarifas e da qualidade das estradas pedagiadas no Estado.
A concessionária Econorte, do Grupo Triunfo, que está no centro das investigações desta fase da Lava Jato (leia mais na página 5), tem a tarifa mais cara do Estado e aparece na 11ª posição no País, segundo dados fornecidos pela ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovia).
De acordo com as informações repassadas pela entidade, o quilômetro custa R$ 0,178, uma diferença 19,4% em relação a segunda tarifa mais alta no Estado. A concessionária tem três praças de pedágio ao longo das rodovias BR-369, em Jataizinho e Jacarezinho, e PR- 323, em Sertaneja.
De 2014 para cá, a tarifa do trecho administrado pela Econorte saltou de R$ 14,90 para R$ 22, na praça de Jataizinho (Região Metropolitana de Londrina). Um reajuste de 47,65%. No mesmo período, de acordo com a pesquisa de Rodovias da CNT (Confederação Nacional dos Transportes), o estado geral da BR-369, no trecho da Econorte, caiu de bom para regular, principalmente entre as praças de Jataizinho e Jacarezinho (Norte Pioneiro).
De modo geral, as rodovias concessionadas no Paraná registraram queda no estado geral nos últimos dois anos. Em 2015, 52,9% dos trechos pedagiados eram considerados bons no quesito estado geral. A pesquisa de 2017 apontou que esse percentual caiu para 45,7% e subiu o índice de trechos regulares, de 25,3% em 2015 para 32,3%.
Em nota, a Triunfo Participações e Investimentos informou que cumpriu 100% dos investimentos previstos no contrato de concessão. De acordo com a nota, do total do valor arrecadado com tarifa de pedágio durante todo o período da concessão (R$ 2,060 bilhões), R$ 1,160 bilhão (56%) foram destinados para investimento em obras e administração da rodovia, e R$ 380 milhões foram destinados para pagamento de impostos. O lucro da empresa correspondeu a 14% da receita apurada no período.
A nota diz ainda que o preço atual das tarifas dos pedágios da Econorte leva em consideração a compensação da redução unilateral do valor em 50% no primeiro ano da concessão (em 1998); atraso no reajuste de pedágio conforme previsto no contrato de concessão; isenção de pedágio para mais de 20 mil usuários nas praças de pedágio. A empresa não comentou o resultado da pesquisa da CNT e nem a sua posição no ranking da ABCR.
De acordo com o diretor-geral do DER (Departamento de Estradas e Rodagem do Paraná), Paulo Montes Luz, o órgão assinou um termo aditivo com a Econorte em 2014 para correção de 21 pontos de desequilíbrio no preço das tarifas. Luz explicou que os termos aditivos vão “sarar as feridas do pedágio”, em alusão a declaração do MPF (Ministério Público Federal) que afirma que o pedágio no Paraná é uma ferida.
“O papel do DER é exatamente, com os termos aditivos, sarar essas feridas e ao chegar o fim do contrato em 2021, poder desligar a chavinha do pedágio do contrato da Econorte e das demais concessionárias e mudar para outra concessionária ou o DER ou ANTT assumem. Essas são coisas que serão definidas pelos próximos governos.”
O diretor-geral criticou a comparação dos valores praticados no Paraná com de outros estados. Ele afirmou que é preciso levar em consideração o volume de tráfego, se o pedágio é de manutenção ou prevê investimentos. “Em São Paulo as rodovias têm um volume de tráfego fenomenal. Aqui no Paraná o volume é bem mais baixo. Temos que comparar laranja com laranja e não laranja com limão”, disse.
Esse volume de tráfego, segundo Luz, também precisa ser levado em consideração na comparação entre as concessões dentro do Estado. “Cada contrato é diferente nos aspectos de arrecadação, tráfego e números de praças. A arrecadação da praça de Rolândia (BR-369 de responsabilidade da Viapar) é maior comparada com a Econorte. O pedágio de Rolândia arrecada quase igual a toda a Econorte. Na Econorte o volume de tráfego é muito baixo para a quantidade de investimentos que estão sendo feitos”, explicou.
Luz também rebateu as críticas da falta de pistas duplicadas nos trechos concessionados. “Criaram uma mística no inicio do contrato de que o Anel de Integração seria duplicado. O contrato não prevê 100% de duplicação”, afirmou. Ele ressaltou ainda que os dois anos e meio que as concessionarias tiveram as tarifas reduzidas em 50% teve um impacto financeiro em todo o período de concessão.
Em 1998, o ex-governador Jaime Lerner, que se preparava para a reeleição, baixou o valor do pedágio para a metade, por decreto. O próprio governador havia assinado os contratos com as concessionárias um ano antes. A medida levou a uma guerra judicial entre Estado e empresas que se estende até hoje. Os valores forem recompostos em 2000.
Pedágio médio do PR é mais caro que o paulista
O pedágio cobrado pela Econorte é o 11º mais caro do País de uma lista de 51 concessões fornecida pela ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias. Para cada um dos 343,7 quilômetros do trecho, a tarifa é de 17 centavos. A relação da entidade trata de rodovias localizadas no Paraná, São Paulo, Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Pernambuco. Não constam os trechos privatizados no Rio Grande do Sul e os mais recentes de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás.
O pedágio mais caro do País, de 87 centavos por quilômetro, é de um trecho urbano, de apenas 6,5 quilômetros, em Pernambuco. Outras concessões pequenas, como a da Linha Amarela no Rio de Janeiro (41centavos) encabeçam a lista dos mais caros. Se forem considerados somente aqueles trechos maiores, com mais de 100 quilômetro, a tarifa da Econorte torna-se a sexta mais cara.
A média de todo o Anel de Integração paranaense, segundo a ABCR, é de 13 centavos, menor do que a fluminense (21 centavos) e maior que a paulista (12 centavos).
Entidades defendem novo modelo de concessão
As entidades empresariais do Estado defendem a necessidade de novas licitações para o Anel de Integração. A Fiep (Federação das Indústrias do Paraná) disse, por meio de nota, que as investigações da Lava Jato reforçam o posicionamento da entidade de que os valores pagos nos pedágios estão acima do aceitável e penalizam a economia e a sociedade.
“Desde 2011, a Fiep tem, insistentemente, alertado que o setor produtivo e a sociedade paranaenses pagam uma tarifa de pedágio muito elevada, fruto de um modelo de concessão distorcido”, afirmou Edson Campagnolo, presidente da Fiep. Ele acrescentou que “as novas revelações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal comprovam essa tese, trazendo à tona uma amostra do tamanho dos prejuízos que o custo do pedágio causa para o Estado”.
O presidente da Fiep afirmou, ainda, que os desvios revelados pela PF foram facilitados, em grande medida, pela falta de transparência e de fiscalização nos contratos do Anel. “A sociedade paranaense, que é quem paga essa conta, nunca teve acesso a detalhes dos contratos ou às planilhas de custos das concessionárias”, comentou Campagnolo.
Ele reiterou que a Fiep defende a construção de um novo modelo de concessão. “Não somos contrários à concessão de obras e serviços à iniciativa privada. Pelo contrário, está claro que o Estado não tem competência para fazer a gestão da infraestrutura. O que precisamos é encontrar um modelo de concessão que, pautado na transparência, possibilite a realização das obras necessárias, mas com tarifas justas para os usuários.”
O presidente do Setecpar (Sindicato das Empresas de Transportes de Carga no Estado do Paraná), Marcos Egídio Battistella, preferiu não comentar a operação da Polícia Federal, mas afirmou que a entidade é contra o valor dos pedágios. “São muito mais caros do que em rodovias paulistas que são duplicadas. Não conseguimos entender o que ocorre no Paraná. Prefiro não comentar a operação, mas a notícia de irregularidades não é surpresa”, disse Battistella.
O empresário lembrou que o custo do pedágio às vezes é maior do que o gasto com diesel. “Em uma rota como Foz do Iguaçu a Paranaguá, por exemplo, às vezes se gasta mais em pedágio do que com combustível”, afirmou.
A entidade é contra a renovação dos contratos e defende novas licitações. “Já sofremos 20 anos com esses valores altos, então defendemos esperar mais três anos para encerrar os contratos e fazer novas licitações”, defendeu Battistella. Ele acredita que um dos desdobramentos das investigações da Lava Jata possa ser a rescisão do contrato com a Econorte e a antecipação da licitação.
PRIVATIZAÇÃO
Apesar do alto custo dos pedágios e da queda no estado geral das rodovias federais no país, o diretor-executivo da CNT (Confederação Nacional dos Transportes), Bruno Batista, defende as privatizações. A pesquisa de Rodovias da CNT em 2017 mostrou que 74,4% das estradas concessionadas foram classificadas como boa e ótima.
“Houve queda de qualidade, principalmente em função do fator sinalização e alguns trechos não receberam os investimentos previstos. Mas dada a falta de oferta de qualidade das rodovias públicas, do ponto de vista do transporte, é melhor pagar o pedágio”, afirmou.
Ele comentou a redução no volume de investimentos do governo federal em recuperação de estradas. Em 2011, o governo aplicou R$ 11 bilhões em rodovias, de lá para cá os valores estão oscilando. Em 2015, o volume reduziu para R$ 5,9 bilhões, em 2016 foram R$ 8,6 milhões e, no ano passado, caiu para R$ 7,9 bilhões.
“As estimativas são de que ainda levará um tempo para o governo federal fazer investimentos em infraestrutura e não havendo disponibilidade para recursos público o que resta é o privado”, avaliou o diretor da CNT. Mas ressaltou que é importante olhar com cuidado as formas de concessão.
*Fonte: Folha de Londrina